Zumbologia – Parte I

Bem-vindos caros mancebos, à primeira aula da matéria de Zumbologia I ministrada por esse vosso amigo que vos escreve, aqui na UCPA (Universidade Coletiva Pós-Apocaliptica). Não é só porque o mundo está acabando e zumbís andam pelas ruas que vocês iam deixar de ter aula!! Ela faz parte de uma série de matérias que serão dedicadas ao aprofundamento da compreensão do fenômeno zumbi, tanto simbólica como objetivamente. Se esse conhecimento te interessa, sente-se confortavelmente na carteira, assine a lista de chamada e trate de prestar atenção!

Nessa primeira aula eu gostaria de começar a responder uma pergunta que acaba passando ao largo da cultura pop: O que são Zumbis?

Aí me respondem: – “Dêr, Yuri, são os mortos-vivos meeew”

Sim, é exatamente isso, mas essa é uma resposta pouco criativa e muito reduzida. Seguindo a linha do último artigo sobre Zumbis, está na hora de expandirmos um pouco esse entendimento tão simplista sobre nossos não tão amados amigos putrefatos. Existem diversos tipos de Zumbis, vindo de diversas culturas distintas e de funcionamento muitas vezes totalmente diferentes!! Nessa nossa jornada através da linha evolutiva zumbi, passaremos por diversos tipos de explicações para o fenômeno do morto-vivo; umas mais interessantes e outras praticamente impossíveis, para nossa tristeza fé no apocalipse zumbi gente!

Para começar a nossa jornada, vamos definir brevemente as bases que definem e fazem um morto-vivo o sê-lo. Como eu disse, existem diversos tipos – assim como existem diversos tipos de cadeira – mas bem, todas elas servem como assento, não é? O que nos zumbis é inerente a todos?

– “Pô véi, eu já falei! Eles são mortos-vivos meeeew”

Justo. Realmente a grande maioria das características de um zumbi podem ser resumidas em uma única: eles são corpos mortos que, por alguma razão, retornaram ao mundo dos vivos. Em sua grande maioria eles também estão em estado variado de putrefação, que geralmente é o que denuncia sua identidade. Mas veja bem, além disso, há muita diferença entre os mortos-vivos.

Deixando de lado as várias formas existentes que temos dentro dessa grande categoria daqueles que não estão nem mortos nem vivos (Múmias, Ghouls, Draughrs, Vampiros, Esqueletos, Revenants, Fantasmas etc…) direcionaremos nossa atenção a somente um deles: o Zumbi. Não abordarei conceitos extremamente divertidos como Zumbis Filosóficos, Autômatos ou Zumbis Sociais, talvez em outro artigo. A diferença radial que farei aqui é entre três categorias:

  • Zumbis Sobrenaturais: são aqueles onde o princípio ativo da sua existência é a partir de explicações que fogem à explicação científica, como feitiçaria ou maldição. São geralmente um corpo humano controlado por um feiticeiro ou por uma alma que os habita.
  • Zumbis Científicos: são aqueles cujo princípio ativo é, de alguma maneira, atribuída à ciência moderna. Não quer dizer que eles sejam possíveis, quer dizer que eles vêm de algum laboratório em algum lugar. Foram infectados por alguma forma de vírus, bactéria ou parasita de alguma outra sorte.
  • Zumbis Possíveis: a cereja do bolo trazida pessoalmente por mim. Aqui me dou o direito de dar a vocês algumas possibilidades passíveis de realidade para a existência de um zumbi. Cientistas de plantão, leiam com carinho para poderem fazer disso uma realidade!

Hoje iremos conversar sobre os conceitos de Zumbis Sobrenaturais e Científicos que são, na sua extensa maioria, somente fruto da imaginação (ou seja, sem respaldo do real). O próximo post dedicarei exclusivamente às possibilidades verdadeiras de um fenômeno do tipo se tornar realidade.

O Zombi HooDoo:

Categoria: Sobrenatural.
Zumbificação: Feitiçaria e/ou controle sobre a alma.

Na cultura Voodoo, pode-se criar, a partir de um cadáver e por um ritual HooDoo, um servo que obedecerá ao Bokor (Feiticeiro). Eles não têm vontade ou livre-arbítrio, porém são respondentes ao seu ambiente, ou seja: escutam, vêem, interagem com objetos caso ordenados. Movem-se com grande lentidão e fedem a carne podre já que… bem… eles são cadáveres. Na África do Sul existe um mito onde uma bruxa pode tomar conta inclusive de um corpo vivo, tornando-o um escravo, por controlar a parcela zombi de sua alma.

Possibilidade de acontecer: Baixíssima.

Motivo: Não há relatos concisos e críveis sobre esse tipo de zumbificação. Como todo ritual religioso, é envolto por uma cortina de crença, fé e misticismo, sendo praticalmente impossível um respaldo científico. Além disso, precisaríamos de um exército de Bokors!

 

 O Zumbi Infernal:

Categoria: Sobrenatural.
Zumbificação: Era um habitante do Hades, Inferno, Tártaro, Hel, ou qualquer outro nome que sua mitologia dê ao reservatório de almas perdidas, que volta ao mundo dos vivos.

 Vemos eles nos mitos, curiosamente recorrentes, onde os portões do submundo são de alguma forma arrombados e seus habitantes são soltos no mundo dos vivos, para causar todo tipo de destruição. Exemplos disso são Ishtar, na suméria Epopéia de Gilgamesh citada no artigo anterior, assim como várias passagens do Apocalipse de S. João Apóstolo 9:

 “E o quinto anjo tocou a trombeta: e vi que uma estrêla caíu do céu na terra, e lhe foi dada a chave do poço do abismo: 2 E abriu ela o poço do abismo: e subiu fumo do poço como fumo de uma grande fornalha: e se escureceu o sol e o ar com um fumo do poço: 3 E do fumo do poço sairam gafanhotos para a terra e lhes foi dado um poder, como têm os escorpiões da terra. 4 E lhes foi mandado que não fizessem dano à erva da terra, nem a verdura alguma, nem a árvore alguma: senão sòmente aos homens que não têm o sinal de Deus nas suas testas.”¹

Completando essa imagem, nos meses sequintes à chegada dos cavaleiros do Apocalipse, diz a bíblia que “naqueles dias, os homens buscarão a morte, e não a acharão, e êles desejarão morrer, e a morte fugirá deles” como um exemplo da não-morte dos que morrem¹.

Possibilidade de acontecer: Baixíssima.

Motivo: Como qualquer exemplo de zumbificação sobrenatural, temos o problema dela ser sobrenatural. Ainda não tivemos acesso à localização geográfica das portas dos infernos, então não tem como saber se os mortos de lá podem sair. Meu medo é que, caso um dia o descubramos, possa lá haver petróleo… aí estamos ferrados, porque os Estados Unidos vão fazer de tudo pra entrar!

O Zumbi de Laboratório:

Categoria: Científico.
Zumbificação: Processo laboratorial de manipulação das características biológicas de um ser-vivo, possibilitando que ele continue ‘vivo’ após o processo natural de mortificação.

Esse é o nosso conhecido de longa-data, aquele zumbi de Resident Evil, The Walking Dead e vários outros títulos do gênero moderno. Por vivermos em uma era onde a ciência é a grande detentora das perguntas e respostas acerca do mistério da vida, nada mais natural que um tema como o zombie mythos fosse por ela intermediada.

O grande protagonista aqui é um virus (como o T-VIRUS², o vírus da raiva ou o Solanum³) um parasita (Las Plagas II e III²) ou um fungo e/ou bactéria (no caso dos Ophiocordyceps unilateralis, do qual falarei mais tarde) que zumbifica o hospedeiro. Na maioria dos casos esses agentes são fruto de experiências em laboratórios, a fim de criar armas biológicas ou similares, baseados em grande parte nas históricas experiências britânicas com bombas biológicas pós-primeira-guerra.

Possibilidade de acontecer: Baixíssima

Motivo: o grande impedimento para as teorias científicas de zumbificação é o fato dos zumbis estarem mortos. É atualmente impossível que um ser, cujas células estão mortas, continue sequer se movendo. Pensando somente na movimentação do corpo humano: temos músculos e tendões que dependem de terminações nervosas, e todos eles dependem de energia. As células do corpo humano o fazem, na sua grande maioria, através das mitocôndrias (ciclo de Krebs, lembram?) por serem aeróbias. A não ser que ocorra uma mutação a nível de DNA que modifique drasticamente a forma de pensar economia energética em um ser vivo, que destrua as células e crie uma nova forma de vida, a possibilidade do Zumbi (morto-vivo) Científico continuará bem distante da realidade.

Conclusão: como vocês puderam ver, estamos muito distantes do Apocalipse Zumbi Ortodoxo. Há pouca validação para a maioria das saídas  criativas que foram até então sugeridas a fim de justificar e tornar o fenômeno zumbi uma realidade. Como alguns de vocês devem ter observado, um dos grandes problemas é caraterizarmos o zumbi como algo morto.

E agora vocês me perguntam: mas e se o zumbi não estiver técnicamente morto?
Aí, caros alunos, chegamos ao assunto da próxima aula: as reais possibilidades de um apocalipse zumbi! Zumbis mortos e putrefatos não existem, mas a realidade pode ser muito mais nefasta e complexa emocionalmente do que poderiamos imaginar…

 

Referências:

1 – Bíblia Sagrada (1971) Bíblia Sagrada edição Barsa (Trad. Pd. Figueiredo, A. P.) (Novo Testamento, pp. 231) Rio de Janeiro: Catholic Press.
2 – Resident Evil (Série)
3 – Brooks, M. Guia de Sobrevivência Zumbi. Rocco: Rio de Janeiro.